A procuradora do Trabalho Maria Aparecida Gugel questionou hoje (22), em audiência na Câmara dos Deputados, a inclusão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) na proposta de reforma da Previdência encaminhada pelo governo à Casa. O BPC é um benefício assistencial no valor de um salário-mínimo, concedido a idosos e deficientes físicos sem necessidade de contribuição.
Para ter acesso ao BPC, é preciso comprovar que a renda familiar é inferior a um quarto do salário-mínimo vigente. Na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, que trata da reforma da Previdência, o governo prevê a elevação de 65 para 70 anos da idade a partir da qual o idoso tem direito a pleitear o BPC. Para Maria Aparecida Gugel, o tema não cabe escopo da reforma.
“Qual a justificativa para inserir no Artigo 203 [da Constituição Federal], que trata de assistência social, a idade de 70 anos ou mais? Assistência social não tem nada a ver com Previdência. Isso está gerando uma insegurança no movimento de pessoas com deficiência e pessoas idosas absolutamente desnecessária. É desumano”, afirmou.
A procuradora também criticou a desvinculação do BPC do salário-mínimo. “A reforma desvincula o valor do pagamento deste benefício do salário-mínimo. Para virar R$ 50, R$ 70, R$ 130?”, questionou. Maria Aparecida disse ainda que o Brasil é signatário de convenções internacionais que vedam retrocessos em direitos conquistados, incluindo a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência.
A professora de medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Izabel Maior, representante do Movimento de Pessoas com Deficiência, ressaltou que o BPC é um benefício provisório e que o governo tem mecanismos de fiscalização para descontinuá-lo em caso de uso indevido. Izabel lembrou que as famílias que dependem do benefício são extremamente pobres.
“Pensem comigo quem são as famílias que podem ter acesso ao BPC. Nós queremos que pessoas idosas e com deficiência fiquem eternamente ganhando o benefício? É claro que não. Mas vamos querer que aqueles que são mais pobres tenham que esperar chegar a 70 anos para sair da pobreza?”, questionou a médica.
Maria Aparecida Gugel e Izabel Maior falaram sobre possíveis mudanças no benefício durante audiência pública na comissão especial da Câmara que analisará a PEC 287.
Adequação
O representante do governo no debate, o procurador federal e assessor especial da Casa Civil Bruno Bianco, negou que haja inconstitucionalidade ou retrocesso na mudança proposta no BPC.“Não há qualquer inconstitucionalidade e não há que se falar em retrocesso, pois o direito continua garantido. É uma adequação”, afirmou.
Segundo Bianco, o BPC é um benefício assistencial, “mas com grandes repercussões previdenciárias”. “[O BPC] tornou-se uma outra opção para aquelas pessoas que não conseguem a contributividade necessária para o benefício da Previdência”, disse. De acordo com dados apresentados por ele, em 2016, o benefício custou R$ 46,5 bilhões aos cofres públicos.
Para o assessor da Casa Civil, quando um benefício assistencial concorre com o previdenciário há “desestímulo” às contribuições. Outro argumento de Bianco é que o BPC inicialmente previa a idade mínima de 70 anos e depois foi flexibilizado. “Temos ações civis públicas, praticamente uma por unidade da Federação, estabelecendo regras diferentes para a aferição de renda”, criticou.
O coordenador de Serviços Previdenciários e Assistenciais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Josierton Cruz Bezerra, acrescentou que a média de beneficiários do BPC é de 185 mil por ano, no caso de pessoas com deficiência; e 165 mil, no caso de idosos.
Emenda
Quando a proposta da reforma da Previdência chegou à Câmara, os deputados Eduardo Barbosa (MG) e Mara Gabrilli (SP), ambos do PSDB, apresentaram uma emenda ao texto do governo mantendo o BPC da maneira como é concedido atualmente. Segundo Barbosa, a emenda tem 187 assinaturas e foi a primeira a ser apresentada.
Na avaliação do deputado, as mudanças no benefício custariam caro ao Estado. “No caso do idoso e de pessoas com deficiência, as vagas de asilos, a assistência direta a essa família pelo Estado, não ficará em um salário-mínimo. Para ficar em uma instituição de longa permanência, por exemplo, o valor
é muito maior que o mínimo”, comparou o deputado.
Barbosa, cujo partido integra a base aliada do governo, disse que ele e Mara Gabrilli apoiam a reforma da Previdência, mas com ressalvas. “Existem questões em que não podemos nos curvar à proposta que veio do Executivo.”
Edição: Luana Lourenço